No início de Maio, o presidente do IGCP, João Moreira Rato, foi entrevistado pelo jornalista José Gomes Ferreira no programa «Negócios da Semana». Nesta eloquente entrevista (ver vídeo), quando inquirido sobre a dificuldade dos aforradores particulares subscreverem, em mercado primário, Obrigações do Tesouro [1], à semelhança do que acontece com a Reserva Federal Americana [2], o espanto e o embaraço do inquirido dizem mais do que um longo discurso. Revelam:
O governo acabou de «encenar» [1] o lançamento do novo benchmark a 10 anos – a OT 5.65% Fev 2024 – através de sindicato composto por seis OEVT [2], a saber: Caixa BI, Goldman Sach, CAI, Citigroup, HSBC e Société Generale. Um dia após a atribuição do mandato, a operação foi colocada com um custo de 5.669%, equivalente à curva de swap+ 400 pb (4%) concedendo um prémio de 13 pb sobre a curva de OT naquele ponto [3].
Cerca de um ano e meio depois da assinatura do memorando, Portugal ‘voltou’ aos mercados. Do lado do governo esta operação foi declarada um sucesso. Convém, porém, colocar algumas questões e esclarecer alguns detalhes que evidenciam os perigos e os custos que esta estratégia implica. Qual o custo e os perigos de um regresso aos mercados apressado e oportunístico, que apenas interessa a investidores que atuam numa lógica de lucros fáceis, isto é, os mesmos que estiveram na base da atual crise? Será que este discurso do bem-sucedido regresso aos mercados mais não é que uma narrativa parcial e simplista, dominada pelo mito do mercado livre, que apenas visa implementar a estratégia que melhor protege os interesses dos credores financeiros - oficiais e não oficiais? Será desejável o regresso aos mercados num contexto em que a economia não cresce, o que torna insustentável a dinâmica recessiva da dívida pública?
À semelhança do Comissário dos Assuntos Europeus, o presidente do Eurogrupo também prometeu apoiar Portugal. Em concreto, prometeu abordar na reunião de Março a definição de uma estratégia de apoio no regresso em pleno aos mercados por parte da Irlanda e de Portugal. Parece, portanto, que a reestruturação «impura» solicitada por Gaspar se vai concretizar. Pretende-se estender as maturidades dos empréstimos do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF) e Mecanismo Europeu de Estabilidade Financeira (MEEF) de, em média, 14.6 e 12.4 anos, respectivamente, para 30 anos, aliviando o plano de amortizações dos anos vindouros e reduzindo por via da inflação o pagamento do principal na data de maturidade.